O Vivarium Festival está de volta ao Porto dia 28, 29 e 30 de março para refletir sobre o impacto da tecnologia nas artes e na sociedade.
“Natural Intelligence, What AI still can’t do?”
Quando a Alfa-Go venceu Lee Sedol, o melhor jogador de Go do mundo, o algoritmo Deep-mind fez movimentos nunca vistos na história do jogo. Foi o horizonte desse jogo milenar - considerado pelos chineses uma arte ao nível da música, da caligrafia ou da pintura - que mudou, quando os jogadores perceberam que ainda havia muitas estratégias por descobrir. Que vergonha para a inteligência humana! Será que os humanos se irão tornar animais de estimação das Inteligências Artificiais (IA), como gosta de repetir Elon Musk?
Em 2019 o Vivarium ambiciona estimular esse debate sobre as convergências e divergências entre Inteligência Natural e Inteligência Artificial, apresentando exposições, performances, concertos, workshops e palestras em vários espaços da cidade do Porto: Maus Hábitos, Ateneu Comercial, Cinema Passos Manuel e Reitoria da Universidade do Porto, com a conferência de filosofia “Criar Conceitos-Seguir Regras”
O tema da edição 2019 é “Natural Intelligence, What AI still can’t do?” em referência ao livro de 1972 de Hubert L. Dreyfus, “What Computers Still Can’t Do, A Critique Of Artificial Reason”.
Numa época em que se especula intensamente sobre as capacidades das IA criarem e em que os comportamentos dos seres vivos são muitas vezes reduzidos a um funcionamento pseudocientífico onde matéria e script são supostamente equivalentes, quisemos convidar artistas e pensadores que questionem o que é realmente específico do vivo; quisemos ultrapassar a oposição Natureza libre e criativa de um lado, versus máquinas ou instituições alienantes do outro, convidando artistas cujos trabalhos perturbam essa oposição tradicional Natura/Cultura.
Como explica o filósofo Tristan Garcia, a inteligência da espécie humana distingue-se das IA porque é uma consciência viva, entre a animalidade que a constitui e as representações que constrói. A partir do momento em que o humano é determinado como acontecimento evolutivo, a única maneira de afirmar uma identidade humana é imitar a evolução natural, artificializando-a; ou seja, tentar fazer mais e melhor do que a evolução natural faz. A Singularidade, versão contemporânea do velho sonho do automatismo, corresponde a essa tentativa desesperada de criar uma identidade diferente, transcendente para além do que existe enquanto determinismo.
Mas, por mais que tente, o animal humano não consegue inventar-se enquanto uma identidade nova. Ele apenas existe “entre”. Entre a criatura e o criador, entre o animal e a máquina, entre a besta e o soberano. Entre viver num ambiente e ser ambiente. Identifica-se com as máquinas para diferenciar-se dos animais e identifica-se com os animais para se diferenciar das máquinas. Só pode curar-se da animalidade pela artificialidade e da artificialidade pela animalidade. A sua autonomia reside nisso. As AI, por mais sofisticadas que sejam, não são autónomas porque não criam as regras. A vida cria regras e problematiza num pré-movimento onde todos os ponderadores possíveis e imagináveis entram em conta, caindo para o lado da vida ou da morte, para o lado da colaboração ou da agressão, da integração ou da desintegração.